domingo, 29 de novembro de 2009

Resenha de NOËL, Dirk. Diachronic construction grammar vs. grammaticalization theory.2006.

Resumo

Embora construções gramaticais pressuponham gramaticalização, os dois fenômenos devem ser considerados separadamente haja vista que além da alteração de construções existentes, também podem surgir construções primárias.

1. Introdução

A Gramática Funcional, anteriormente posicionava-se apenas contrária aos postulados da Gramatica Gerativa, já que seria um equívoco sustentar uma teoria que subestima o falante: a língua "ideal" de Chomsky é considerada pelo Funcionalismo como ingênua, artificial e ineficiente diante da rela produção linguística. Atualmente, destacam-se nos estudos funcionalistas as questões relacionadas à Gramática das Construções (CG) e à Teoria de Gramaticalização (GT), abordagens, muitas vezes, consideradas sinônimas. Preferir-se-á, referenciá-las de modo a se complementarem. Para Bybee (2003), o processo de gramaticalização deve ser entendida como a "criação de novas construções", desse modo a GT desse se preocupar "como as línguas adquirem gramáticas". Se unirmos as duas citações podemos perguntar "como as línguas adquirem construções".

2. Construções em Teoria de Gramaticalização

Grosso modo, construções são unidades maiores do que palavras. Apesar de que estas também sejam construções gramaticais são atômicas e aquelas complexas, isto é, multimorfêmicas. Em Traugott (2003), gramaticalização e "o processo pelo qual o material lexical em pragmática e contextos morfossintáticos específicos adquire função gramatical e, uma vez gramatical, alcança a função de operador." Esse "material lexical" é antes "uma construção com itens lexicais" em vez de simplesmente um "item lexical". Desse modo, fala-se em "esquema de construção", como exemplificado em Bybee(2003):

[[verbo + movimento progressivo] cláusula finalidade +( infinitivo)]

[[Estou indo] para (ver)] o rei.


[[Estou viajando] para (ver)] o rei.

[[Estou cavalgando] para (ver)] o rei.

Observe-se, nesse caso, a gramaticalização do verbo "indo", empregado em forma de gerúndio por analogia com outros verbos nessa estrutura, seguida pela rotinização.Considere-se a importância do contexto sintagmático em que ocorreu o fenômeno, ou seja, considera-se um "esquema de construção" e não apenas itens lexicais isolados. Bybee (2003) acrescenta que a GT pode incluir o estudo de padrões de ordenação argumental linguística. Essa consideração referente á ordem dos termos vai evocar questionamentos quanto a passagem de item livre para fixo e vice-versa. Hoffman (2004), considera gramaticalização como estabelecimento de esquemas de construção cujas lacunas podem ser preenchidas com apropriados itens lexicais. Em relação a esse posicionamento, Noël (2005) discorda de Hoffman ao separar o surgimento de construções esquemáticas e a gramaticalização.

3. Gramaticalização na Gramática de Construção

Em Gramática de Construção, itens lexicais são parte da Gramática, palavras são construções.Em Tomasello (2003), construções linguísticas são símbolos linguísticos em conjunto cujo significado decorre, em parte, dos símbolos individuais. Esse processo histórico é chamado gramaticalização ou sintaticização. Para esse teórico, itens lexicais e construções surgem, evoluem, acumulam modificações ao longo do tempo.Não significa que sequências de palavras fundem-se numa única estrutura morfológica, mas que haverá uma nova organização sintática. Em Croft (2001),o processo de gramaticalização envolve três etapas: inicialmente, uma construção adquire uma nova função; numa etapa intermediária, essa nova função é convencionada de modo a se desvincular da função que lhe deu origem; numa etapa final, a nova construção sofre mudanças gramaticais, a saber, sintáticas, morfológicas fonológicas. Heine (2003), listam-se mecanismos envolvidos no processo de gramaticalização concebidos como micromudanças inseridas em macromudanças: i dessemantização ou redução semântica; ii extensão ou uso em novos contextos; iii descategorização ou passagem de forma livre a forma fixa e vice-versa; iv erosão ou redução fonética.Traugott(1982), assim como Halliday (1976) distingue os componentes proposicional, interpessoal e textual. Nesse âmbito, as mudanças ocorreriam de uma dimensão menos pessoal para mais pessoal em decorrência de fatores pragmáticos, por exemplo, a passagem da preposição "até" espacial para "até" temporal. Esse processo é tido como subjetivo, abstrato, polissêmico. Para Israel (1996), variados usos idiomáticos ganham gradualmente força produtiva e esquemas cada vez mais abstratos podem ser extraídos. Para Langacker (1990), é o processo segundo o qual itens gramaticais evoluíram a partir de fontes lexicais a partir de um movimento ao longo de um continuum, em vez de saltar de um componente para outro.

4. Construções argumentais e Gramaticalização

Ressalta-se a distinção entre gramaticalização e construcionalização como fenômenos em que ocorrem, respectivamente, mudanças morfológicas e sintáticas. Uma questão pertinente diz respeito a valência verbal, que, em certos casos sofreu mudança em seu padrão. Verbos dativos, relacionados a objetos indiretos passarem a se ligar a objetos diretos.Desse modo, o estudo de Gramaticalização envolve estrutura argumental. Tomasello (1998) considera que as construções de base transitiva pressupõe um sujeito que causa mudança de estado em um objeto como em "Ele quebrou o vaso." Ao longo do tempo, essas construções foram estendidas metaforicamente a outras situações menos prototípicas em que a dinâmica mudança de estado não é tão clara como em "Ele entrou no quarto." Comparem-se as frases: "Ele foi ao centro da cidade." e "Eu comprei livros no Rio de Janeiro.". Embora os termos destacados representam um lugar, diferenciam quanto à exigência junto ao verbo. A frase "Ele foi*" seria agramatical, portanto "ao centro da cidade" é um argumento do verbo "ir", mais especificamente, um objeto indireto; o que não ocorre com a frase "Eu comprei livros.", gramatical, que não exige o termo "no Rio de Janeiro", de valor circunstancial, não proposicional, considerado adjunto adverbial.

5. Observações finais

O objeto de estudo da Teoria da Gramaticalização (GT) refere-se, portanto, a mudanças semânticas e suas possíveis correlações formais. A Gramática das Construções (CG) refere-se ao modo como surgem e se tormam gramaticais as construções linguísticas. Nesse sentido, GT e CG são considerados estudos complementares. Considere-se que este tenha um alcance mais vasto do que aquele.Cabe à Gramática das Construções documentar como e quando novos padrões gramaticais instauram-se numa língua. Desse modo a Teoria da Gramaticalização é considerada de modo sincrônico e a Gramática das construções de modo diacrônico.







domingo, 8 de novembro de 2009


RESENHA de NEVES, Maria H. de M. Texto e Gramática. São Paulo: Contexto,2007.
(pág 118 a 122)


A RECATEGORIZAÇÃO

Se um objeto discursivo já foi categorizado, isto é nomeado, ele poderá ser recategorizado. A designação remissiva pode ser mais específica que a inicial como em "Existe mimetismo quando um
animal ou vegetal se parece com outro. É o caso de certas aranhas que se parecem com formigas; borboletas que se parecem com outras espécies de borboletas; vespas agressivas disfarçadas de moscas inofensivas." Poderá ocorrer o inverso, ou seja, a designação remissiva ser mais genérica do que a inicial como em "Quando chegava a safra dos pequis, eles se ausentavam até acabar a fruta." Esses processos de recategorização, respectivamente, nomeados hiperonímia e hiponímia ocorrem de maneira alternada no texto. Hiperônimos podem estar marcados positiva ou negativamente em termos de intensão (operação sobre a categorização inicial) como em "Por que matar Chistopher? Não bastaria cortar um dedo desse traidor?" A recategorização pode operar também o mecanismo de extensão por meio de ampliação, redução, fragmentação, condensação. Um caso clássico de ampliação é o uso de 3ª pessoa do plural com indeterminação como em "Saiu uma nota no jornal que é batata. Eles não dizem o nome, mas dão toda a ficha." Em relação ao processo de fragmentação podemos exemplificar com "O certo é que se deva continuar importando trigo considerado melhor que o nacional. Se formos transferir essa proposta, essa visão unilateral de qualidade para outros produtos, o Brasil teria de importar muitos outros itens." Percebe-se que, nesse caso, o objeto discursivo é "a importação de trigo". A expressão "proposta" indica o "modo de agir" e "visão unilateral de qualidade", o "modo de ver a situação". Apothéloz e Reichler-Béguelin(1995) denominam esse processo de "exploração da dimensão polimórfica do processo". A operação inversa, chamada fusão, reúne dois objetos discursivos como em "Força primordial, emanações benignas e malignas, faixas de radiação, magnetismo cósmico, esses troços. Em caso de anáfora, um episódio de pronominalização pode se referir à dimensão extratextual como em "É como se você tivesse um rádio e não soubesse que ele serve para sintonizar emissoras." Nesse caso, a designação "rádio" tem caráter específico, pertence ao interlocutor, mas a designação "ele" tem caráter generalizante, pertence a todos os rádios. Pronomes anafóricos representam recategorização implícita "em virtude se sua marca de gênero." (op cit) como em "A Catita fora posta pela mãe dormindo num trilho de Piau, mas o diabinho acordou e foi jogado pelo vento contra o barranco. Vieram entregá-la em nossa casa." A preferência pelo gênero feminino em "entregá-la" sugere uma categorização neutra, não avaliativa. Deve-se mencionar ainda a passagem a um nível metalinguístico, isto é, de sinonímia, em que "uma denominação em uso para a uma denominação em menção." (op cit) como em "Se surpreendeu ao ver onde era o Estádio da Portuguesa. Quando a gente ouve falar Canindé acha que é do outro lado do mundo." Além da metalinguagem, configura-se também o fenômeno da modalização pois "toda denominação indica um ponto de vista sobre o objeto designado." (Neves, 2007:117) Isso é percebido em "Ele disse que partirá amanhã pra São Paulo. Eu já previa essa chantagem.

(RE)CATEGORIZAÇÃO E MANIPULAÇÃO DO ENUNCIADO

(Re)categorização e avaliação

Tanto uma designação inicial como uma remissiva podem representar uma avaliação acerca do designado. Essa predicação avaliativa pode ser "disfórica" ou "eufórica", respectivamente, negativa ou positiva como se percebe nos exemplos a seguir: "É o doutor Bartolomeu quem quer fazer essa
barbaridade.", "Mande vir essa maravilha." Às vezes, os aspectos de disforia e euforia são marcados por adjetivos como em "É um belo acervo." Pode ocorrer também "denominação citada"(op cit) por meio da qual as denominações sugerem pontos de vista que não pertencem ao produtor dos enunciados como em "Ieltsin disse que Moscou havia sido durante bom tempo 'muito mole' em relação aos chechenos. Foi uma de suas poucas declarações conclusivas." A denominação citada em posição catafórica seria assim:"Leia essa miséria: 'Com a infeliz criancinha nos braços, Loredano estreitou a mão de Miguel num shake hands cúmplice, apontou para o crucifixo que empunhava na destra. E enquanto intimava 'jure por este!' com a mão esquerda acariciava o cabo do revólver." A recategorização porde representar um reforço de avaliação já ocorrida como em "Usava mascara de couro com furos para os olhos, boca e nariz. Mariana deu-lhe a bolsa que o bandido pegou rapidamente."

(Re)categorização e argumentação

O aspecto modal da linguagem está intimamente relacionado à eficiência argumentativa textual. A ocorrência de anáforas, por exemplo, com frequência apresentam direcionamento corroborativo acerca das denominações que o falante faz de um indivíduo ou de um estado de coisas. Nos exemplos a seguir percebem-se pontos de vista, respectivamente, favorável e contrário em relação ao objeto discursivo designado: "
Michael Jordan, entrou na quadra quase três horas antes do jogo. A Folha acompanhou durante uma semana o maior jogador de basquete da história.", "'Isso não é bom', disse o brigadeiro Sócrates Monteiro diante da mobilização nas ruas. O que não é bom é militares darem lições de civismo e política à sociedade." A categorização ou recategorização de objetos discursivos frequentemente coincidem com mudança paragrafal. É o caso de "sobremarcação da estrutura discursiva"(op cit) como no exemplo a seguir: "Fariam as pazes, mas as brigas recomeçariam adiante. Novas humilhações. Novos sofrimentos. A incompreensão de sempre. Essa era a situação: não podia mais permanecer ali. O que fizera de sua vida, era aquilo?"


domingo, 25 de outubro de 2009

RESENHA DE
"A ALMA ENCANTADORA DAS RUAS",

DE JOÃO DO RIO

João do Rio, pseudônimo de Paulo Barreto, nasceu no Rio de Janeiro em 1881 e lá morreu em 1921, um ano antes da Semana de Arte Moderna, movimento artístico revolucionário ocorrido na capital paulista. Ele assistiu à Abolição da Escravatura (1888) e à Proclamação da República (1889), episódios que trasformaram o perfil sócio-político-econômico, não apenas do Rio, mas de todo o Brasil.A "Cidade Maravilhosa", chamada "Cidade da Morte" até o início do século XX, foi capital brasileira de 1763 a 1960, quando a sede do governo federal é transferida para Brasília. A antiga alcunha mórbida decorreu das epidemias de febre amarela, varíola, cólera, peste bubônica que atingiram grande parte da população carioca, que já contava com aproximadamente um milhão de habitantes. O sanitarista Oswaldo Cruz realizou, na administração de Pereira Passos, prefeito do Rio durante o governo de Rodrigues Alves, de 1902 a 1906, um trabalho de controle dessas doenças: uma das estratégias foi comprar ratos! Além dos programas ligados à saúde pública, Passos promoveu inúmeras transformações urbanísticas sob os moldes de Paris. Esse plano de governo foi conhecido como "Bota-abaixo" pois demoliu casarões, cortiços, abriu ruas, alargou outras. O desenvolvimento na área dos transportes, da comunicação, da eletricidade, do saneamento é responsável por intensa urbanização carioca, mas houve consequências sociais drásticas. Cerca de 1600 velhos prédios residenciais foram demolidos na região central da cidade e, como não houve programas habitacionais suficientes para os menos favorecidos, iniciou-se o processo de favelamento no Rio de Janeiro. Em 1902, Paulo Barreto tenta se tornar diplomata. Mulato, obeso, homossexual, não consegue realizar esse propósito, pois o então Ministro das Relações Exteriores, o Barão do Rio Branco, posiciona-se de maneira preconceituosa. João do Rio investe na carreira jornalística: o livro "A Alma Encantadora das Ruas", editado em 1908, é uma coletânea de crônicas anteriormente publicadas no Jornal Gazeta de Notícias e na Revista Kosmos. E o que é uma crônica? Trata-se de um texto ligado a fatos do cotidiano. É que faz João do Rio. Quanto ao seu estilo, pode ser considerado um tanto quanto caleidoscópico, como a própria cidade documentariamente descrita por ele. Em predomínio realista, ora manifesta-se naturalista, ora parnasianista, ora modernista. A crônica, gênero textual em questão, é um traço modernista. Direciona críticas aos românticos e simbolistas, mas reconhece que, a arte popular conserva muito desses estilos. O próprio João do Rio, antevendo as iminentes mudanças no rumo da arte, afirma que "não estamos propriamente em um momento de arte pura." Esse era o pressuposto fundamental do estilo parnasianista, em destaque na segunda metade do século XIX. O Parnasianismo tem como características principais a preocupação formal, o vocabulário precioso, o descritivismo, a referência greco-romana. Tais atributos estão nitidamente presentes no livro em análise. Outro conceito pertinente a essa análise é o de caleidoscópio. Trata-se de pedaços coloridos de vidro, colocados entre dois ou três espelhos planos. Essa metáfora sugere que "A Alma Encantadora das Ruas" mostra o Rio em várias facetas multicoloridas. João do Rio divide o livro em cinco partes: A rua, O que se vê nas ruas, Três aspectos da miséria, Onde às vezes termina a rua. Na primeira parte, a rua é descrita de maneira evolucionista: "(...)cada rua é para mim um ser vivo.(...) Há ruas honestas, ruas ambíguas, ruas sinistras, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem história, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira, ruas guerreiras, revoltosas, medrosas, spleenéticas, snobs, ruas aristocráticas, ruas amorosas, ruas covardes, que ficam sem pinga de sangue...(pp.33 e 34)". Na segunda parte, citam-se várias profissões informais: ciganos, que roubam e revendem; os belchiores, que compram roupas e as revendem; os selistas, que vendem selos de cigarros e charutos caros para serem reutilizados em marcas mais baratas; os ratoeiros, que recolhem ratos pela cidade e os vendem ao governo. Há também os fuzileiros; as meretrizes; os carregadores; os marinheiros; os bombeiros; os doceiros; os tatuadores; os vendedores de orações; os urubus (serviço mortuário); os vendedores de livros; os pintores; as lojas com seus nomes hilários; os traficantes de ópio; os músicos; os cocheiros; os foliões do reisado; os foliões do carnaval. Na terceira parte, detalham-se aspectos ligados à exploração das prostitutas, dos estivadores nos portos, dos imigrantes portugueses que extraem manganês nas pedreiras, dos menores; ora, trabalhadores, ora infratores. A mendicância, principalmente, por parte das ex-prostitutas, é descrita como uma habilidade cenográfica. De maneira naturalista, descreve-se uma zunga; isto é, um cortiço, uma hospedaria barata: "(...) não se podia andar sem esmagar um corpo vivo. A metade daquele gado humano trabalhava; rebentava nas descargas dos vapores, enchendo paióis de carvão, carregando fardos.(p.179)". Na quarta parte, vamos para a Casa de Detenção, em que as celas foram chamadas "jaulas" no livro analisado. O alcoolismo é apontado como a principal causa de prisão. Alguns alcoólatras estiveram no manicômio, antes da penitenciária. Já no século XIX, verificavam-se os mesmos problemas no sistema penitenciário brasileiro: superlotação, ociosidade, profissionalização dos leigos, promiscuidade, jogatina, tráfico de drogas, reincidência, falta de higiene... Havia, inclusive, um chiqueiro de porcos na Casa de Detenção do Rio de Janeiro. O que mais chama a atenção é a imunidade elitista, que impera até hoje: "Nem os moços valentes, nem os senhores respeitáveis, nem os jornalistas vão sequer à delegacia.(p. 205)" João do Rio exalta o detento desse início do século como um poeta que tem quatro ideias capitais: o retorno da monarquia, o apego à religião, o receio da imprensa, o desejo de liberdade... Alguns versos sugerem que havia discriminação contra os brasileiros, haja vista a presença de imigrantes no país: "Sou um triste brasileiro/ Vítima da perseguição/Sou preso, sou condenado/ Por ser filho da nação." Na quinta parte, instaura-se um Parnasianismo Moderno em que João do Rio, encontra a "Musa" nas ruas. É uma referência à inspiração que o cronista reconhece espalhar-se por todos os ambientes urbanos, independente da condição social ou étnica.Trata-se de uma espécie de mitologia popular, em que os deuses não têm poder econômico; são inferiores, mas declamam, cantam, pintam... Enfim, fazem arte: "(...) por que teimaremos nós em dizer que a poesia preferiu nosso cérebro ensaduichado em literaturas estrangeiras à alma simples do povo ignorante?"(p. 236).


sexta-feira, 16 de outubro de 2009

RESENHA "ESTE MUNDO DA INJUSTIÇA GLOBALIZADA" DE JOSÉ SARAMAGO




A PSEUDODEMOCRACIA

"Este mundo da Injustiça Globalizada" é um ensaio de José Saramago lido por ele no encerramento do Fórum Social Mundial de 2002 ocorrido em Porto Alegre, no Brasil! Esse gênero textual é, segundo a página da wikipédia na internet, "um texto literário breve, situado entre o poético e o didático, expondo ideias, críticas e reflexões morais e filosóficas a respeito de certo tema". Saramago foi, até esta data, o único escritor em Língua Portuguesa a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, fato ocorrido em 1998. Saramago lembra sal amargo, chamado pela IUPAC de sulfato de magnésio, composto químico de indicações agrárias e médicas, tem o sabor oscilante entre o ácido e o amargo, informação também colhida na wikipédia ... Coincidências à parte, Saramago tem o mesmo sabor, pelo menos aos que ele chama de "esquerdistas, anquilosados em fórmulas caducas, alheios ou impotentes para enfrentar as realidades brutais do mundo actual, fechando os olhos às já evidentes e temíveis ameaças que o futuro está a preparar contra aquela dignidade racional e sensível que imaginávamos ser a suprema aspiração dos seres humanos." Em 1995, Saramago publicara o romance "Ensaio sobre a cegueira" e, em 2004, "Ensaio sobre a lucidez" ambos de caráter sócio-político-econômico. Podemos estabelecer intertextualidade entre esses romances e "Elogio da Loucura" publicado pelo holandês Herasmo de Roterdã em 1509. Essa obra é considerada "um dos mais influentes livros da civilização ocidental e um dos catalizadores da Reforma Protestante"(Wikipédia). A propósito, o supracitado fórum ocorreu em 2002, portanto entre os dois romances referenciados. Nessa oportunidade o autor abordou a dialética situação em que se encontra o mundo dividido: muita riqueza para poucos e muita miséria para muitos! Ele ataca o processo de globalização, contexto em que "o rato dos Direitos Humanos" acabará devorado pelo "gato da globalização econômica". Somos ratos ou gatos nessa história? Se compactuamos com a atual concentração desumana de renda, cultura, saúde, educação, cidadania de um modo geral, somos gatos; se badalamos o "sino", aquele mesmo que um camponês italiano fez soar pela morte da Justiça no século XVI, somos ratos... Camundongos crescidos, reforçados pela indignação acumulada desde o início da "Idade Moderna": Renascimento cultural! Quem foram os mecenas dos analfabetos, marginalizados sociais, nossos ascendentes? Mercantilismo! Quanto ouro o citado camponês de Florença conseguiu adquirir em toda sua vida? No dicionário de símbolos, o sino é descrito de maneira dicotômica: anuncia o nascimento e a morte. Basta lembrar do sino como símbolo de Natal... E da prática de se tocar o sino quando morre alguém... Então, já que a Justiça está morta, vamos tocar o sino pela sua ressurreição,em âmbito globalizado assim como vive a Injustiça, por quem também há de dobrar o sino, anunciando seu fim! Ironicamente ele sugere que não adianta vendar os olhos da Justiça e lhe viciarem os pesos da balança... Saramago refere-se à Democracia como um sistema político demagógico que não tem nada de popular, cujas premissas precisam ser reavaliadas com urgência. Ele desprestigia o direito do voto, como uma prática inútil diante do poder econômico, "única e real força que governa o mundo".Para finalizar, Saramago exalta a Declaração Universal dos Direitos Humanos acima de qualquer programa de governo ou metas sindicalistas, em que o tão aclamado bem-comum não passa de um chavão, clichê, lugar-comum apropriado em discursos manipulatórios pré-eleitorais.

RESENHA "ORAÇÃO DOS DESESPERADOS" DE SÉRGIO VAZ





MANO BROWN NA COOPERIFA

Quando li o texto que ora me promonho a analisar, senti um comoção profunda! Felizmente existem pessoas como o paulista Sérgio Vaz, que se preocupam com o bem-comum. O mais interessante foi notar que esse "pensar coletivo" ultrapassa a fome do estômago, alcança a fome do espírito, afinal " a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte". Não acreditei quando li na Revista Época de março desse ano que uma senhora de 42 anos, moradora de Taboão da Serra em São Paulo, onde Vaz criou a Cooperifa, nunca havia ido ao cinema até a estreia do "Cinema na Laje" no mês da citada edição de Época. A tal Cooperifa parece-me uma Associação de Moradores de uma periferia, basta observar a composição da palavra que sugere Cooperativa da Periferia. Essa organização não-governamental gerenciada por Vaz tem, presumo, finalidade econômica e cultural. Ele é radical: "se os 'deuses de gravata' evocados na oração querem nos violentar, violentemo-lhes antes; em vez de comprarmos seus produtos, produzamos os nossos!" Além do "Cinema na Laje", que ocorre duas vezes por mês, o "Colecionador de Pedras" como se intitula em seu blog, promove o Sarau de Poesia, uma vez por semana,PASMEM, no Boteco do Zé Batidão porque "periferia não tem museu nem teatro, mas tem boteco". Lá ele instalou uma biblioteca. Essas "pedras", segundo Vaz, "não falam, mas quebram vidraças". Percebo a intenção desse artista em popularizar a arte e, por extensão, coibir a violência e a alienação social: "perco poetas para a faculdade, mas não para a novela." O povo simples pega o microfone e declama sobre si: violência, prostituição, desemprego; também versam sobre amor e sonhos... O Sarau do Zé Batidão acontece ao mesmo tempo que o Sarau do Bezerra em Porto Alegre, e o Coletivoz em Belo Horizonte, eventos de inspiração paulista. Reconhecimento seja feito ao pai do "vira-lata", outra perífrase do sujeito, que ofereceu livros a ele estimulando todas essas elucubrações, que se tornaram, em tese, uma das razões de viver desse brasileiro que tomou posse à força de sua cidadania! Certamente, ele se interessou por Victor Hugo, Oswald de Andrade, Ferreira Goullar, Mário Quintana, João Cabral de Melo Neto, Ivan Junqueira, Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira dentre outros a quem ele faz referências, a partir das leituras de seu pai... VIVAM OS PAIS LEITORES.... Outra empreitada de Vaz foi a "Semana de Arte Moderna da Periferia", "contra os vampiros das verbas públicas e arte privada", ocorrida em 2007 nos moldes antropofágicos oswaldianos: vamos comer os "engravatados" e metabolizar, metamorfozear a arte dos "periféricos" com muito orgulho! Outro evento idealizado por Vaz, que eu achei o "must" foi o "Ajoelhaço"... Ele coloca, alguém me corrija se eu estiver enganada, uns marmanjões covardes que agridem suas mulheres verbal e/ou fisicamente para ajoelhar no Dia da Mulhe, 08 de março, para pedir perdão diante delas... Eu queria muito ver isso! Filma aí, Vaz, pra gente acreditar que isso acontece mesmo! heheheheh... Digressão encerrada. Vamos orar!!! Em desespero, porque o "Deus de Gravata" não parece um deus clemente, tal qual Cronos, que devorava seus filhos ou Zeus que tentou exterminar a humanidade! O termo "senhores" no poema pode ser lido de maneira polissêmica: Senhor, em caráter metafísico, sobrenatural, acima dos homens; Senhor, quase doutor, em caráter hierárquico social, acima dos "homens comuns", mortais desescolarizados, encolerizados, mas não coleirizados... O trecho "Escuta este canto/que lindo este povo! /quilombo este povo! que vem a galope com voz de trovão." me lembrou Bandeira: "Café com pão, café com pão, café com pão(...)" Imaginei um "beat box", como dizem os meus alunos. O final da oração é show: parafraseando, "atende essa oração que clama por justiça, senão esse que ora vos ora se arma quase num intento camicase urbano do tipo 'eu vou, mas levo deus comigo'. Perceba-se que o verbo "levar", nessa circurstância tem um sentido de morte a esse deus injusto e a seus iguais, nada mais justo. Considerem-se os intergêneros textuais e discursivos: poema-prece ou prece-lírica, sem falar no tom ensaístico, argumentativo que percorre todo a tessitura do poema por meio da polifonia dialética instaurada: desesperados em diálogo com desesperantes, que correm o risco de se verem destronados em razão de sua indiferença ante o desespero dos menos "engravatados".

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

RESENHA - INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA
MUSSALIM ET AL


1. LINGUÍSTICA HISTÓRICA

No século XIX, com o advento do Racionalismo, emergiram os estudos diacrônicos linguísticos, principalmente acerca do latim, grego e sânscrito. O inglês William Jones propôs que essas línguas fossem aparentadas entre si. Buscavam-se mudanças fonológicas, morfológicas e semânticas que teriam provocado o nascimento de novos códigos. Comparavam-se línguas a fim de se identificar uma origem comum entre elas. A postulação de "árvore genealógica" de uma língua, por influência dos estudos genéticos, então em voga, é pertinente a esse estudo histórico-linguístico: as linguas neolatinas, dentre as quais o Português, estão numa mesma árvore, têm uma mesma origem, ou seja, o latim.










2. SOCIOLINGUÍS
TICA

Na segunda metade do século XIX, por influência do pensamento evolucionista, a linguagem é vista pelo alemão Schleicher como um organismo "que nasce, cresce e morre"(p23- vol1). Assim, não se consideram fatores sociais no fenômeno comunicativo humano. Em contrapartida, no início do século XX, o francês Saussure desvincula a linguagem dos estudos biológicos: inauguram-se os estudos linguísticos a partir do postulado da imanência da língua, ou seja, considerada em si mesma e por si mesma. Dessa forma, fatores sincrônicos estarão em evidência, o sistema linguístico interno será o foco de destaque. Daí o rótulo "estruturalista" atribuído a Saussure. A partir de então, considera-se a "arbitrariedade do signo" em oposição ao caráter realista atribuído à linguagem pelos filósofos gregos. A principal dicotomia estabelecida nesse estudo foi "língua-fala", sendo a primeira prestigiada em relação à segunda. Na segunda metade do século XX, destaca-se a obra do russo Jakobson com a "Perspectiva Funcional da Sentença". Ele critica a homogeneidade saussuriana referente ao código linguístico. A heterogeneidade yakobsoniana considera fatores externos envolvidos na comunicação. Além do código, estudado exautivamente por Saussure, participam do processo comunicativo o remetente, a mensagem, o destinatário, o contexto e o canal. Esses elementos até hoje são estudados em nível médio acerca das "funções da linguagem". O francês Benveniste (1963) corrobora o caráter social da linguagem e acrescenta que "é dentro da, e pela língua, que indivíduo e sociedade se determinam mutuamente." (p.26 - vol 1) Após essas considerações acerca dos fatores extralinguísticos na efetivação do processo comunicativo, vale salientar o destaque alcançado pelo americano Labov nos estudos conhecidos como "Sociolinguística Variacionista". A língua um instrumento verbal sujeito a mudanças, precedidas por variações. A consideração de que o comportamento linguístico está relacionado a fatores como idade, sexo, ocupação, origem étnica, atitude fez emergir uma gramática descritiva, que permite a consideração de normas além da padrão e de variantes dialetais. Iniciou-se uma discussão ferrenha sobre "preconceito linguístico". A noção de erro prevista pela gramática normativa foi substituida pelos conceitos de adequação e inadequação linguísticas, totalmente vinculados a um específico contexto comunicativo.























3. LINGUÍSTICA GERATIVA

O Gerativismo de Chomsky inserem-se dentro do chamado Formalismo , assim como o Estruturalismo de Saussure. Ambos foram considerados "mentalistas" em oposição aos "realistas" da antiguidade clássica, dentre eles, Platão, Aristóteles e Sócrates que consideravam a palavra numa correspondência biunívoca em relação às coisas do mundo. Chomsky considera a língua uma herança, e atribui à mente a função de exteriorizar essa "competência" inata. A partir dessa materialização falar-se-ia em "desempenho". Outro conceito chomskyano é o de "criatividade", atributo limitado pela língua. O principal traço que diferencia o Estruturalismo do Gerativismo foi a consideração de um "ser pensante" que produz enunciados restritos às regras gramaticais, que o antecedem haja vista que o Gerativismo postule a autonomia da sintaxe. O Gerativismo acrescenta o nível transformacional aos níveis linguisticos previstos pelo estruturalismo americano representado principalmente por Bloomfield, a saber, fonemas, morfemas, palavras, categorias sintáticas, estrutura frasal e transformações. A Teoria dos Casos pertinente ao Gerativismo prevê que "a sentença que verbo finito atribui o caso nominativo a seu sujeito; o verbo atribui o caso objetivo a seu complemento; e a preposição atribui o caso oblíquo a seu complemento." (p. 119 - vol 3) Com a teoria dos "Princípios e Parâmetros", Chomsky considera respectivamente a dimensão universal e a particular na configuração do jogo linguístico.























4. LINGUÍSTICA FUNCIONAL


A Sintaxe não é autônoma como afirma o Gerativismo. Ao contrário, ela depende da Semântica e da Pragmática. Halliday(1967, 1974), na Inglaterra, enfoca a motivação discursiva da estrutura sentencial com base na oposição dado-novo, tema-rema. Na Checoslováquia, Weil (1874) distinguira movimento de ideias expresso pela ordem das palavras e movimento sintático expresso pela desinência. Às considerações de Weil, Mathesius acrescenta que a ordem não-emotiva, não-marcada configurar-se-ia em tema-transição-rema; enquanto a ordem emotiva, marcada corresponderia à rema-transição-tema. Sujeito ou tópico e predicado, entidades gramaticais, vinculam-se a tema e rema, entidades comunicacionais. Esses estudos influenciaram sobremaneira as postulações de Halliday que considera a organização do sistema linguístico em três macrofunções: ideacional (mundo-mente), textual (criação de mensagens), interpessoal (atos pragmáticos de fala). Nessa última, considerem-se os conceitos de tópico, entidade evocada no discurso, chamada de tema por Dik; foco, informação a ser ressaltada; definitude, vinculada a informação compartilhada; oração em camadas, que permite através da predicação, designarem-se estados de coisas; ordenação de constituintes, selecionada pelo falante a partir de seus propósitos. Givón(1979), nos Estados Unidos, elenca os princípios comunicacionais: dinamismo comunicativo ao qual se vinculam as discussões acerca de fluxo de atenção e ponto de vista; grau de planejamento, monitoramento face a face, conhecimento pragmático compartilhado . É o fluxo de atenção que determina a ordenação dos sintagmas nominais. O falante seleciona uma sequencia algumental que pressupõe atrair a atenção do ouvinte. Dik (1989) na Holanda entende que "uma Gramática Funcional deve conformar-se a três princípios de adequação descritiva: pragmática, psicológica, tipológica." (p. 171- vol3). A partir desse pressuposto, os parâmetros funcionais fundamentam-se nos conceitos de figura-fundo, cadeia tópica, transitividade (Hopper e Thompson, 1980), fluxo de informação, gramaticalização. A parte do discurso que lhe dá sustentação e não contribui para os objetivos do falante é chamada fundo, o material que fornece os pontos discursivos principais é chamado figura. A transitividade é entendida como um atributo oracional que se transfere de um agente a um paciente. O fenômeno da gramaticalização corresponde a um processo pelo qual um item lexical passa a exercer função gramatical. A noção de estrutura argumental preferida proposta por DuBois nos Estados Unidos vincula padrões gramaticais preferidos nas línguas acusativas e ergativas a princípios de distribuição de informação. Chafe(1976), também no Estados Unidos, diferencia tópico e sujeito: o tópico deve ser sempre definido, o sujeito não precisa; o tópico não precisa ser um argumento do verbo, o sujeito apresenta algum tipo de restrição selecional a ele vinculada; o tópico sempre vem especificado, o sujeito admite-se vazio; o tópico manifesta-se sempre em posição inicial, diferentemente do sujeito; este, e nunca o tópico, possui papel relevante em processos como reflexivização, passivização, apagamento de elementos co-referenciais.



sexta-feira, 21 de agosto de 2009


ANÁLISE LITERÁRIA - A PELE DO LOBO - ARTUR AZEVEDO
Professora Neide Domingues


Artur Azevedo, nascido no Maranhão em 1855 e falecido no Rio de Janeiro em 1908, foi teatrólogo, contista, jornalista e poeta. Foi responsável pela consolidação da comédia de costumes brasileira. Pertencente à segunda metade do século XIX, é considerado um autor que se insere no período literário intitulado Realismo. O Brasil vivia o Segundo Reinado (1840-1889), época marcada pelos movimentos abolicionista e republicano. Desde o fim da Guerra do Paraguai em 1870, a monarquia e a escravidão eram alvos de críticas. Artur Azevedo abordou principalmente assuntos cotidianos ligados a então capital brasileira, Rio de Janeiro. Suas obras são consideradas documentários sociológicos sobre a evolução comportamental do brasileiro. Indiretamente, são propostas discussões sobre ética e cidadania.
Em "A Pele do Lobo", sátira teatral de Azevedo encenada pela primeira vez no Rio de Janeiro em 1877, percebe-se uma temática conflitante. Configura-se a oposição entre a defesa da liberdade, bem como dos direitos e deveres sociais e os poderes, às vezes abusivos, antiéticos, ineficientes de ocupantes de cargos públicos. A peça se passa em Ato Único, sendo o cenário uma delegacia de polícia, também residência de Cardoso, o subdelegado que se "submete" a esse cargo na expectativa de ser promovido. Nesse local, Apolinário, típico brasileiro semianalfabeto e bajulador, aborda Cardoso a fim de registrar queixa contra Jerônimo por roubar algumas de suas galinhas. Como não consegue redigir a ocorrência, ironicamente, Cardoso "dita" o que ele deve escrever. Amália, esposa do subdelegado, apressa o marido todo o tempo, pois, mesmo em horário de expediente, sairiam para um batizado. Nota-se profundo descaso e ineficiência de Cardoso no desempenho de sua função.
Numa outra cena, Jerônimo deseja manisfestar sua defesa. Esse personagem leva sua queixa pronta, redigida em "um papel sujo que Cardoso pega com repugnância" e três testemunhas. Ele faz o tipo agressivo, determinado "custe o que custar", impertinente e atrevido. Demonstra embriaguez. Jerônimo reclama da burocracia, da morosidade da Justiça, da "pândega das autoridades concomitante ao sofrimento do povo". Além desse desacato verbal, ameaça o subdelegado com uma faca por chamá-lo de "insolente" e acaba preso. Percorre o drama acusado-vítima-acusado devido a sua dificuldade em lidar o sistema jurídico brasileiro, não tem nenhuma polidez, sutileza ou noção de hierarquia no trato social. Jerônimo representa o brasileiro que destrói o bem público: joga cinzas do cachimbo no chão e cospe na parede da delegacia três vezes.
A metáfora do lobo, presente no título da obra e na frase "Quem não quiser ser lobo não lhe vista a pele", proferida por Amália, sugere que se não quer passa horas ouvindo as partes de um processo, não se candidate ao cargo de subdelegado. Neste cargo tem-se de lidar com pessoas de diferentes níveis sociais, econômicos e culturais, com papéis, bandidos e exposições públicas. A fala "E metam-se a servir o país" manifestada por Cardoso diversas vezes sugere profunda ironia em relação ao funcionário público que, em tese, serve o país e não é reconhecido, recompensado por isso. Tanto que, no final da peça, Cardoso, em vez de promovido como deseja, é demitido, configurando-se a "ingratidão" do país para com seus préstimos.
Nota-se na linguagem de "A pele do lobo" um caráter realista típico da literatura da segunda metade do século XIX, muitas vezes, sem "papas na língua" ou a inverossímil idealização, a adjetivação exacerbada do Romantismo. São contemporâneos desse período vários estudos sobre a adaptação social (Determinismo) e a seleção natural (Evolucionismo) e o prestígio da Observação sobre a Imaginação (Positivismo), correntes filosófico-científicas focadas no homem, em sua dimensão material, objetiva. A visão idealizada de um homem sem falhas de caráter, capaz de dar a própria vida por seus valores, seus ideais e aspirações ficara na primeira metade do século em questão, no platonismo romântico.

sexta-feira, 31 de julho de 2009


A etimologia de uma palavra, muitas vezes, intriga... Um exemplo é a palavra "rival". Ela tem origem na palavra "rio", porque nossos antepassados já disputavam água. Do latim (XVII) rivalis, de rivus (rio).


quinta-feira, 30 de julho de 2009

O RITMO DA CHUVA

FERNANDA TAKAI E RODRIGO AMARANTE

sexta-feira, 17 de julho de 2009


3º LUGAR EM CONCURSO NACIONAL DE POEMAS - 2005

O dito pelo não-dito


Neide Domingues


Este cordão não me serve para nada!
Se ele me permitisse um contato fônico
Ou, ao menos, telepático,
Aí sim poderia prorrogar a minha vida,
Intermediar negociações,
Facilitar protelações...

Canal vital que transporta
Oxigênio e nutriente...
Até quando?
Insuficiente!

Ele é um verdadeiro não-leva-e-traz...
Minhas súplicas antitabagistas e antialcoólicas
Contra qualquer tipo de fetocídio breve ou lento
Certamente irão comigo para algum recipiente de pesquisa
Ou lixeira mesmo... Não faz diferença!
E traz informações que confirmam
Minhas suspeitas:
Estou com a vida por um fio!
Ou melhor, por um cordão,
Por um estúpido cordão!

Por que ele não se enrola de uma vez em mim
E abrevia essa aflição?
Ao menos, não seria testemunha de um crime covarde...

Não terei direito nem à primeira palavra,
Muito menos à última!
Mesmo assim, deixo meu testemunho
Contra a pena de morte intrauterina
Gravado neste minúsculo cérebro

E, se eu for cobaia de algum laboratório,
E alguém conseguir ler a minha mente,
Saiba que fui gente!
Não soltei pipa, nem enchi balões,
Mas, nos poucos meses que vivi,
Amei mais a vida
Do que qualquer um que respire
Pelos próprios pulmões...

Amnioticamente imerso,
Chego a imaginar-me um alevino,
Talvez um girino...
Minha expectativa de vida
Seria menos desprezível!

Não!!! Nem peixe, nem anfíbio,
Nem réptil, nem ave...
Sou um cordado racional
E estou acordado!
Só estou trancado
E não tenho a chave!
Tenho o cordão,
Mas ele não me vale...


quinta-feira, 9 de julho de 2009

PARADEIRO - ARNALDO ANTUNES E MARISA MONTE

SOCORRO - ARNALDO ANTUNES

SAIBA - ARNALDO ANTUNES


POEMA-CONCRETO DE ARNALDO ANTUNES

quarta-feira, 8 de julho de 2009


ARNALDO ANTUNES - 2004




JÚLIO MANZI - 2009


MENOR POEMA DO MUNDO


ELE TEM APENAS 35X440 NANÔMETROS, QUATRO MIL VEZES MAIS FINO DO QUE UM FIO DE CABELO. UM NANÔMETRO VALE UM MILIONÉSIMO DE MILÍMETRO. O RESPONSÁVEL PELA PROEZA FOI O POETA E COMPOSITOR JÚLIO MANZI. ARNALDO ANTUNES, EM 2004, NA 4ª EDIÇÃO DO FESTIVAL DE ARTE DE JOÃO PESSOA EXPÔS O MESMO POEMA "INFINITOZINHO", NUMA VERSÃO ESCULTURA, COM 125 CENTÍMETROS. OLHA O DIALOGISMO DE BAKHTIN AÍ, GENTE... A PROEZA FOI POSSÍVEL POR MEIO DE UMA PARCERIA ENTRE A UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS E O LABORATÓRIO NACIONAL DE LUZ EM MARÇO DESSE ANO. MANZI É DOUTORANDO PELA UNICAMP COM O TEMA "TRANSCRIAÇÕES: REINVENTANDO POEMAS EM MEIOS ELETRÔNICOS". EM VEZ DE TINTA OU GRAFITE, USARAM-SE FEIXES DE ELÉTRONS. PENSA!!!

terça-feira, 7 de julho de 2009

MUNCH-NIETZCHE-1906

ACABEI DE CRIAR ESSE BLOG... TENHO A DIZER APENAS "SOU BLOGUEIRA"... SÃO 19:48 DE 07/JULHO/2009, ESTOU SÓ, MAS NÃO SOU SÓ SÓ.... TAMBÉM SOU ACOMPANHADA! SOU A ORIGEM DE MEUS DEVANEIOS, DE MINHAS NIETZSCHITUDES: LEÃO (EU QUERO), CAMELO (EU DEVO) E CRIANÇA(EU SOU). ASSIM FALOU ZARATUSTRA...